O reservatório hoje se resume a uma poça de lama fétida no centro e algumas canoas no chão rachado
por José Avelino Neto - Colaborador
Quixadá. Antes tido como cartão-postal, o Açude Cedro causa impacto aos visitantes. O reservatório acumula seus últimos 0,25 hm³ em uma poça de lama fétida formada bem no centro do terreno onde antes havia água em abundância. No último fim de semana, havia 13 canoas e um pequeno barco no açude seco.
Primeiro reservatório construído no Brasil, por ordem de Dom Pedro II, não há mais uma gota d'água transparente no Cedro para fazer jus à sua centenária história de abastecimento humano no País. De acordo com o Portal Hidrológico do Ceará, o Cedro detém apenas 0,2% dos 126 bilhões de metros cúbicos de água que ele é capaz de armazenar, percentual ao qual ele chegou no último dia 30 de agosto.
Cenário chocante
Aliado à Pedra da Galinha Choca, monumento monolítico que repousa bem defronte ao açude, o Cedro é o detentor do olhar de turistas que visitam a cidade por sua história e beleza. "Eu tenho 30 anos e cresci com as histórias de cheias em Quixadá, da beleza do açude, construído num tempo tão antigo. Hoje a gente fica estupefato vendo um cenário desses", desabafa o advogado Robson Almeida, natural de Acopiara. "Para ver ele cheio de novo, não tem outra solução: tem que pedir a Deus", completa.
O choque e a perplexidade foram as descrições encontradas pela estudante Kélvia Rodrigues, depois de também passear pelo enorme paredão do Cedro, já totalmente descoberto. "É um cenário chocante ver um açude histórico como o Cedro nesta atual situação. Deixa a gente muito triste. Provavelmente houve um uso inconsciente da água para que o açude chegasse a essa situação", diz.
A seca do reservatório afeta desde o turismo até a geração de renda. O guarda do escritório do Dnocs que fica na entrada do açude diz já ter visto, nos fins de semana, cerca de oito ônibus com excursões turísticas, por dia. "Hoje não para mais nenhum. Aqui está praticamente deserto", garantiu.
O cenário foi previsto pelo presidente da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh), João Lúcio Farias, em reportagem do Diário do Nordeste do último dia 22 de outubro. "No ritmo em que está indo, ele deve secar. Eu não diria nos próximos dias, mas nos próximos dois meses, ele deve secar por completo", disse João Lúcio na época.
Embora sua construção tenha dado início à história do abastecimento no Brasil, o Cedro já não era mais o responsável pelo abastecimento de Quixadá desde agosto de 2009, ano em que o reservatório registrou sua segunda pior média desde 2004, data a partir da qual constam os registros de medição do Portal Hidrológico do Ceará. Desde então, a cidade é abastecida por meio de uma adutora do Açude Pedra Branca, em Quixeramobim, que de acordo com a Cogerh, é capaz de manter a cidade por todo o ano que vem, mesmo que não chova.
Explicação
Para o gerente regional da Bacia do Banabuiú da Cogerh, onde o Cedro se insere, Paulo José Gomes Ferreira, a evaporação pode ter sido a principal causa da tão rápida seca do açude. "A questão da baixa pluviometria, relacionada ao período de cinco anos de chuva abaixo da média, faz com que a evaporação aumente. No Cedro a evaporação é algo em torno de 65%", garante.
As denúncias de retirada ilegal de água do açude por pipeiros é um fator que também pode ter contribuído para que a reserva hídrica chegasse a um volume tão pequeno. O gerente regional diz ter tratado do assunto em uma recente reunião da Cogerh.
O doutorando em geografia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), Marlon Cavalcante Santos, explica que a engenharia da época em que o açude foi construído, diferente da que passou a ser usada a partir da década de 1950, pelo Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), também pode ter sido um fator decisivo. "Ele foi erguido no período imperial e tratava-se de uma outra forma de engenharia, onde não se conhecia de forma tão técnica a realidade do Semiárido.
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