Elas se destacam em profissões que culturalmente são atribuídas aos homens. Das cidades de Iguatu e Crato, surgem exemplos de força e resistência que superam os preconceitos e redesenham seus espaços na sociedade
Fonte:DN/Região/regiao@verdesmares.com.br
Resistência
A 150 km de Iguatu, Regilane Gonçalves, 41, prepara a sela, dá banho e alimenta o cavalo e parte do Sítio São Bento, em grupo, para a tradicional Festa da Santa Cruz da Baixa Rasa, que ocorre todo dia 25 de janeiro, no Crato. Sua filha, Yara Lima, de 17 anos, a acompanha desde os cinco. "A gente compra roupas das equipes, se prepara. É um prazer estar naquela multidão", conta. Durante o caminho, na ladeira do Lameiro, encontra suas duas irmãs, Roberta, 33, e Natália, 30, que mantêm as paixões pela vaquejada e pela cavalgada como tradições familiares.
Com chapéu de palha na cabeça, óculos escuros, camisa polo amarela - cuja cor ressalta a inscrição da equipe "Filho do Mato"- e ao lado da imagem de Nossa Senhora Aparecida, Roberta e Natália cantam versos de montaria (à capela), seguidos de aboio, na tradicional celebração. À frente de centenas de vaqueiros, a dupla arranca aplausos. Entre as expressões, uma voz ressoa: "Vaquejada é coisa de mulher, sim!".
Neste ano, Roberta pode até considerar que foi "menos" vaidosa, já que na edição anterior da principal cavalgada do Crato fez questão de combinar sua vestimenta com a de seu animal. Chapéu, peitoral e luvas; tudo rosa. "É um momento de se arrumar bem", complementa. Se no meio da multidão - de maioria masculina -, elas se destacam, no cotidiano não é diferente. Regilane, a mais velha, conta que é tão raro ver uma mulher em cima de um cavalo que as pessoas ficam "admirando". Por essa e outra razões intrínsecas à sociedade, a mulher é alvo de cantadas de homens da cidade. "Mas a gente leva na esportiva", admite.
Com inspiração no pai, o vaqueiro Antônio Gonçalves (o popular "Bigode de Ouro"), Regilane começou a trabalhar como vaqueira ainda adolescente, dando banho, comida e até aplicando injeção em equinos; por mês, ganhava em torno de R$ 80. Hoje, Regilane realiza todo esse trabalho nos seis cavalos que possui, dos quais cuida sozinha.
Com o nascimento dos filhos, o animal-amigo também ficou inseparável, já que levava a filha Yara e o irmão mais velho, ainda pequenos, para a escola, a aproximadamente 10 km de casa. Foi nesse momento que a caçula pegou gosto por montaria. Louro, o cavalo que Yara ganhou aos 13 anos, é até hoje o parceiro da adolescente, que já treina para participar de competições.
"A vaquejada como esporte ainda é muito desigual Brasil afora", pontua Regilane. A maior premiação na categoria feminina no Ceará, por exemplo, acontece na Vaquejada do Complexo Franskim Pedro, em Maranguape, que oferece o valor de R$ 10 mil, no total.
Este mesmo evento já chegou a premiar até R$ 350 mil na categoria masculina. Algumas das competições ainda oferecem inscrições gratuitas para as vaqueiras. Porém, muitas atletas não disputam por causa das despesas de viagem e aluguel das baias. Mesmo sendo campeã, muitas vezes, não compensa.
Para tentar incentivar a prática entre as mulheres, foi criada, em 2012, a Associação Brasileira de Vaqueiras (Abrava), entidade que as auxilia nas provas oficiais e realiza suas próprias competições. Seus principais campeonatos acontecem em oito etapas nos estados de Pernambuco, Paraíba, Maranhão, Ceará e Pará.
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