Escola Maria Leite de Araújo conseguiu em poucos anos dar uma virada na qualidade do ensino. A escola investiu no fim das salas multisseriadas, no envolvimento dos pais, na melhoria da merenda, organização do transporte e formação de professores.
Por César Dassie, Brejo Santo, CE
Uma escola rural do sertão do Ceará se transformou em referência de qualidade. A Escola Municipal Maria Leite de Araújo, localizada na zona rural de Brejo Santo, fica em uma região pobre e sempre enfrentou problemas típicos das escolas públicas do Brasil, mas em poucos anos conseguiu uma virada.
O brincar que leva ao aprender. A participação que constrói um novo ensinar. Foram essas as lições que todas as escolas de Brejo Santo passaram a fazer a partir de 2009, quando teve início um processo de reestruturação do ensino. Deu tão certo que o município viu sua nota subir no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, o IDEB: passou de 4,7 para 7,2 no ensino fundamental 1. O salto da Escola Maria Leite de Araújo foi ainda maior: de 3,1 para 9,2.
Maria das Graças Nunes Bezerra é a diretora da escola que acompanhou toda a transformação que ocorreu. Para ela, uma das mais eficientes mudanças nesse processo foi o fim das aulas multisseriadas, que mantinham em uma mesma sala alunos de diferentes idades e séries e que faziam o professor se desdobrar.
“A cabeça dele ficava mergulhada em milhões de coisas, porque um perguntava uma coisa a seu nível, outro de outro, e era humanamente impossível fazer um trabalho de qualidade desse jeito. Quando passamos a trabalhar de forma sem a multisseriação, eu acredito que foi aí que começou a andar. Com um professor mais focado, o aluno responde melhor”, afirma a diretora.
Ao longo desses anos de mudanças no ensino, muitas outras coisas melhoraram na escola, que antes tinha apenas uma sala de aula e atendia 18 alunos. Hoje, cinco salas dão conta de 180 crianças por dia, dez vezes mais.
As reuniões de pais e mestres passaram a ocorrer com mais frequência depois dessa reformulação no ensino. O comprometimento dos pais fez toda a diferença no aprendizado do filho. “A família acaba sendo uma extensão da escola. Mesmo que o pai não conheça, ou a família não tenha alguém com nível de estudo mais alto, eles podem acompanhar sim e nos ajudar. Ter essa hora de estudo em casa, a atenção do pai, a valorização do que ele está aprendendo é muito importante”, afirma Maria Adina Souza de Oliveira, coordenadora pedagógica da escola .Para estimular ainda mais a participação dos pais, a escola criou a maleta viajante, que o aluno leva para casa e vai sempre acompanhada de um livro.
Trabalho coletivo
A melhoria no ensino é resultado de um trabalho coletivo, que depende de muita gente. Tem a motivação dos alunos, o envolvimento das famílias, a qualidade do transporte e da merenda e, claro, a valorização do professor.
O trabalho de reorganização do ensino em Brejo Santo não mexeu apenas com a estrutura das escolas. Ele interferiu também na rotina dos pequenos agricultores do município, que passaram a entregar a produção para a merenda das crianças.
Por ano, cada agricultor pode entregar para o sistema educacional o máximo de R$ 25 mil em produtos. É a soma das cotas do Programa de Aquisição de Alimentos e o Programa Nacional de Alimentação Escolar.
Pelas estradas rurais de Brejo Santo é possível cruzar com mais um marco da reformulação escolar do município: sempre de manhã bem cedo, perto do horário do almoço e no fim do dia, circula o transporte que leva e traz os estudantes.
Para mudar a educação, o município de Brejo Santo também investiu na formação dos seus professores. Encontros se tornaram frequentes para afinar a pedagogia das escolas. O que parece brincadeira, é aprendizado que gera ensinamento.
Somando os alunos do ensino infantil e fundamental 1 e 2, Brejo Santo tem hoje 7.420 crianças matriculadas, tanto na zona urbana, quanto na zona rural.
Para alcançar todas essas conquistas, a secretária de Educação do município, Jacqueline Mendes, revela o que foi preciso fazer: “Não teve segredo, nem pulo do gato. A própria lei que rege a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) nos dá caminhos para fazer uma boa educação. O que compete aos municípios é fazer essa lição. Lá tem universalizar a matrícula, reduzir o terço da jornada do professor, tem formação de professores. Assegurar os 200 dias letivos e 800 horas aulas para o aluno é fundamental.
Jacqueline fala sobre o tempo para as mudanças acontecerem: “Eu acho que para que haja um resultado expressivo, no sentido de estar naquilo que a gente desejaria que estivesse, pode ser realmente que leve décadas, gerações. Mas para que você tenha um resultado que possa perceber, ser percebido, não precisa de tanto tempo. Hoje a Maria Leite está maravilhosa para o que ela era antes. Mas teve que ter dinheiro também. O professor de Brejo Santo com 40 horas ganha aproximadamente R$ 4.060”.
O valor corresponde ao piso salarial e está acima da remuneração média mensal do professor de escola pública no restante do Brasil, que é de R$ 2.455. Brejo Santo oferece, ainda, gratificações que podem aumentar o ganho do docente. Um dos exemplos é o 14º salário, que o município se compromete a pagar caso a escola tire nota 10 no sistema anual de avaliação do estado do Ceará.
Para bancar os gastos, a Secretaria de Educação de Brejo Santo dispõe de R$ 39 milhões por ano, somando os recursos municipais e federais.
A transformação no ensino de Brejo Santo começou há apenas nove anos. Prova de que um projeto bem feito pode trazer resultados rapidamente. Confira a reportagem completa nos vídeos acima.
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