Nos últimos anos, dados pessoais entraram no centro de disputas econômicas e políticas. Essas informações passaram a ser chamadas de “o novo petróleo” e organizações internacionais classificam como o principal insumo de uma “4ª revolução industrial”. Na política, as denúncias de interferências em processos políticos e eleições por grandes plataformas colocou em evidência o poder da coleta desses registros para direcionar anúncios e mensagens.
Neste cenário, emerge uma disputa silenciosa entre as diversas iniciativas de coleta de dados e as tentativas de se proteger dessa prática, seja por meio de legislações seja por condutas cotidianas. Navegadores usados em desktops e smartphones são um dos canais por meio dos quais cidadãos têm sido monitorados.
O alerta foi dado por Veridiana Alimonti, representante da entidade internacional Eletronic Frontier Foundation (EFF), na nona edição do “Seminário sobre Proteção à Privacidade e aos Dados Pessoais”, evento promovido pelo Comitê Gestor da Internet, em São Paulo, que reuniu especialistas internacionais no tema.
No encontro, a especialista em políticas digitais, que também já integrou o comitê, chamou a atenção para as formas de vigilância das pessoas por meio de sistemas como Chrome, Firefox, Safari e Internet Explorer. Por meio de diversos mecanismos, empresas coletam e reúnem informações sobre pessoas sem que elas saibam.
Esses registros permitem que, ao acessar determinado site ou serviço (como uma página de comércio eletrônico), o site identifique de quem se trata, abrindo espaço para formas de segmentação e até mesmo discriminação. Um exemplo desse tipo de prática é a diferenciação de preços pelo CEP do comprador.
Um dos mecanismos utilizados nesse monitoramento são os conhecidos cookies, instalados em dispositivos ao acessar um site. Os cookies são pequenos “pedaços de código” (ou mini-programas) criados para registrar dados da navegação das pessoas e repassar a empresas com fins de rastreamento.
Esse tipo de recurso é utilizado em geral por agências de marketing digital, cuja adoção ocorre para que os anúncios “sigam” os usuários pelos sites pelos quais navegam. Nesses casos, o usuário pode apagar os cookies instalados. Cada navegador oferece essa funcionalidade em determinado local das suas configurações.
Outra técnica de vigilância é conhecida como “supercookie”. Nela, provedores incluem códigos nos cabeçalhos de navegação para cada cliente, mas que não são vistos pelo usuário. Assim, quando uma pessoa faz um acesso, o site pode ler o identificador e saber que se trata de determinado computador ou domicílio.
“Impressão digital” dos navegadores
Contudo, há um sistema de rastreamento mais perigos que os cookies, mostrou Veridiana Alimonti no seminário do CGI, conhecido pelo nome em inglês “fingerprinting”, termo que designa uma espécie de “impressão digital” formada no navegador de cada pessoa. Quando alguém acessa um site, empresas conseguem atribuir uma identificação a um navegador em um computador por meio da combinação de várias informações, como elementos da configuração do navegador e do computador, fuso horário, entre outros.
“Sites podem fazer isso sem serem detectados. Essa informação não está no seu computador, mas nas empresas. Isso pode ser usado, inclusive, para recriar os cookies. Essa técnica não oferece nenhuma funcionalidade útil aos usuários e na prática cria um potencial identificador global por meio do qual se pode acompanhar a navegação dos usuários e criar perfis de forma mais obscura”, analisou a especialista.
Navegadores mais seguros
Internautas têm hoje à disposição diversos navegadores. Entre os mais famosos estão Google Chrome, Internet Explorer, Safari (da Apple) e Mozilla Firefox. Mas há outros menos conhecidos como Tor, Brave e Opera. Segundo ranking realizado pelo site ExpressVPN, especializado em publicidade, o navegador mais seguro é o Tor Browser, seguido pelo Firefox e pelo Brave.
“Ele é um Firefox com vários consertos relacionados à segurança e privacidade. Além de encaminhar todo o tráfego através da rede Tor, ele bloqueia funcionalidades nos sites que podem ser usadas para te identificar. Os sites que tentarem monitorar você não vão conseguir diferenciar seu acesso do das milhões de pessoas que usam Tor diariamente. Alguns sites não carregam bem nele, mas é a melhor alternativa”, recomenda o diretor de tecnologia da organização Coding Rights e membro do conselho editorial do Boletim Antivigilância, Lucas Teixeira.
O Mozilla lançou recentemente o Firefox Focus para dispositivos móveis, com alguns mecanismos de proteção contra rastreamento. Ele permite bloquear rastreadores de anúncios, de análise, de redes sociais ou de conteúdos. Além disso, deixa o botão de remoção do histórico de navegação na tela inicial, facilitando a operação.
O Firefox para desktops possui alguns plugins (extensões) para evitar coletas indevidas. Um exemplo é o chamado “Facebook Container”, que “isola” a aba da rede social e impede que ela possa registrar o que o usuário faz em outras abas. É por meio dessa vigilância, por exemplo, que o Facebook usa o dado de uma visita que você fez em um outro site (como uma busca sobre uma cidade) para oferecer anúncios (como a venda de passagens para aquela cidade).
Um dos mecanismos anunciados pelos navegadores como forma de garantir um ambiente mais seguro são as abas “privativas” (ou denominação semelhante). Esses recursos, entretanto, segundo Lucas Teixeira, são pouco efetivos, valendo apenas para evitar que o site acessado fique registrado no histórico de navegação e não guarde cookies depois de fechada a janela, mas não protege contra formas mais sofisticadas de monitoramento.
Ferramentas de proteção
A Eletronic Frontier Foundation criou um projeto para alertar usuários sobre técnicas de rastreamento por meio de navegadores, chamado Panoptclick. Acessando o site, é possível fazer um teste para verificar se o seu Chrome, Microsoft Edge ou Firefox estão protegidos desse tipo de mecanismos.
Além do projeto, a Eletronic Frontier Foundation também disponibiliza um plugin (extensão) que protege navegadores de mecanismos de rastreamento que são instalados por sites. O recurso é chamado “Privacy Badger” (Texugo da Privacidade, na tradução do termo em inglês).
Na avaliação de Lucas Teixeira, esta é uma boa ferramenta. Ela não elimina totalmente a tentativa de inserir “impressões digitais” nos navegadores (fingerprinting), mas evita a instalação de vários rastreadores.
O especialista alerta que, mesmo com um comportamento seguro em relação aos navegadores, é preciso estar atento também com outros programas, especialmente aplicativos em smartphones. Os usuários devem desabilitar autorizações para usos diversos, como câmeras e microfones, como forma de evitar coleta maciça de dados por esses sistemas e dispositivos.
(Agência Brasil)/VIA REVISTA CAMOCIM
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