O plantio, de uma espécie típica, a arábica, ocorreu pela primeira vez ainda no século passado, no ano de 1913
FONTE:DN/REGIONAL
por Alex Pimentel - Colaborador
Mulungu. Cem anos após a primeira colheita, a quarta geração da Família Farias preserva o cultivo do café sombreado no Sítio São Roque, propriedade rural de 20 hectares, situada neste Município do Maciço de Baturité. A tradição foi iniciada por Alfredo e Amélia Farias, e mantida ao longo do século pelo filho mais novo do casal, Gerardo Farias. Apesar do recente falecimento dele, seus filhos e netos resolveram manter a tradição e continuar o cultivo agroecológico do fruto do cafeeiro. O plantio, de uma espécie típica, a arábica, ocorreu pela primeira vez em 1913, pelas mãos de Alfredo e Amélia. Cinco anos depois, em 1918, acompanhando o casal dedicado ao cultivo de frutas, ainda hoje uma das potencialidades produtivas da região, os colhedores começaram a apanhar os primeiros grãos nos balaios. Na época, a região já contava com transporte ferroviário, implantado exatamente para facilitar o escoamento da produção de frutas, verduras e do café, que, até 1882, era feito por animais.
Naquele momento, era pensado e aplicado o primeiro modelo de café em agrofloresta, sombreado, uma referência para o Maciço, explica Maria Tereza, uma das seis filhas de Gerardo. Ele foi o primeiro presidente da Associação dos Produtores Ecológicos do Maciço de Baturité. Viajou à Europa com outros produtores para demonstrar as práticas de cultivo do café orgânico, capaz de assegurar a renda familiar para criação e educação dos filhos. Houve até exportação do produto para a Suécia, viabilizada por parceira com a Fundação Cultural Educacional Popular em Defesa do Meio Ambiente (Cepema). Até 2004, dividiu com a esposa, Terezinha Bezerra Farias, as responsabilidades e o sucesso produtivo do sítio. Ela faleceu naquele ano.
Em 2008, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Mulungu ainda era o maior produtor do Ceará. Sozinho, o Município detinha quase 30% da produção estadual, com 13.937 sacas de 60Kg. A pesquisa foi realizada por outra filha, Rita de Cássia, e apresentada nas comemorações do centenário de fundação do São Roque, em 2013. Hoje, a realidade é outra. A produção é essencialmente familiar.
Outra filha de Gerardo, a professora Mônica Maria, se tornou empreendedora. É ela quem tem a missão de administrar a colheita. No ano passado, lançou a marca de café ecológico Atelier 1913. São dois tipos, o torrado e moído e o torrado em grãos. Eles recebem os nomes dos avós, Alfredo - Torra média e de Amélia - Torra escura. Atendendo à risca um pedido do pai, durante os fins de semana, com a ajuda da família, do marido, do filho e da cunhada, fazem a torrefação, moagem, empacotamento e selagem, artesanalmente. É uma família apaixonada por café. Gerado e Terezinha tiveram sete filhos. São seis mulheres e um homem. Carmem Silvia, Adélia, Joana Darc, Tereza, Mônica, Rita de Cássia e Alfredo.
Administração
O pai se dedicou ao cultivo e comercialização do café in natura por 75 anos. Ele assumiu a administração da propriedade aos 18 anos, deixando para trás o sonho de ser dentista. Entretanto, além de manter os trabalhadores habituados ao cultivo e colheitas especiais, para manter a tradição, os mais jovens estão apreendendo a arte de cuidar do cafezal. Desde 2015, o Sítio São Roque integra a Rota Verde do Café, projeto de empreendedorismo do O Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas no Ceará (Sebrae-CE).
Segundo o Sebrae, nos anos de 1950, a cultura do café sombreado era bem representativa da economia do Maciço. Chegou a exportar cerca de 30ton de café orgânico certificado, um produto diferenciado.
Fique por dentro
Pesquisadores dizem que a origem é a Etiópia
Conforme as pesquisadoras Maria Sylvia Saes, Maria Célia Martins de Souza e Malimiria Norico Otani, o cafeeiro (Coffea arabica) é originário do sub-bosque da floresta do planalto da Etiópia, antiga Abissínia. Em muitas partes do mundo, em especial nas regiões próximas do equador, como Colômbia, Costa Rica e Java, quando o café começou a ser cultivado comercialmente, procurou-se imitar seu habitat natural, plantando-o na sombra. No Brasil, os primeiros produtores aparentemente não sabiam como se plantava o café em outras localidades e aplicavam técnicas tradicionais de derrubada e queimada da mata em grande escala tal qual se fazia na produção de cana-de-açúcar e algodão (Dean, 1997). No fim do Império, cerca de 50 anos após sua implantação em escala comercial, vários agrônomos ainda discutiam tópicos como técnicas de plantio, espaçamento, adubação e aração, enquanto a questão do sombreamento era considerada um tema exótico e só praticado em estados de pequena produção como Ceará, Bahia e Espírito Santo.
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