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terça-feira, 25 de julho de 2017

SABER MILENAR.

Cair sete vezes, mas levantar oito

FONTE:DN/VOCÊ EMPREENDEDOR 

Cair sete vezes, mas levantar oito.” Este ditado japonês é sinônimo de persistência e resume, com precisão, a trajetória de Jiro Nagaura, maior produtor de alimentos orgânicos do Estado do Ceará. Natural de Sendai, localizada ao Norte do Japão, Jiro completou, em março, 80 anos – 41 deles vividos no Brasil, onde chegou em 1956. A crise na economia brasileira o levou de volta para o Japão, entre 1990 e 2010, mas o amor pela profissão e pela família o fizeram retornar. “Estávamos sozinhos lá, minha esposa e eu. Dois velhinhos. Os filhos e netos já tinham vindo para o Brasil e resolvi começar tudo de novo por aqui”, conta o empreendedor.
Técnico agrícola de formação, Jiro Nagaura utiliza os ensinamentos orientais e os fundamentos da agricultura orgânica para ter sucesso em seu negócio – que gera cerca de 200 empregos diretos e indiretos e se destaca pela qualidade dos produtos. “Quem planta tomate convencional, e não conhece, não consegue tirar nem um quilo por pé. Eu, com a agricultura orgânica, consigo tirar de cinco a sete quilos”, compara. “Na agricultura, o empreendedor tem que investir, pensando lá na frente. E, com muita esperança, porque nem todas as vezes essa esperança é concretizada. Dependemos muito do clima”, ensina.
Nesta entrevista exclusiva ao Você Empreendedor, Jiro Nagaura conta seus exemplos de perseverança, explica as vantagens da agricultura orgânica e traz conselhos para quem pretende empreender.

VOCÊ EMPREENDEDOR: Por que o senhor veio para o Brasil?
JIRO NAGAURA: 
Eu me formei em 1955, como técnico agrícola, e me inscrevi em um programa do governo japonês para trabalhar em um projeto na Cooperativa Agrícola de Cotia (SP), fundada por japoneses. Na época, vieram 3 mil rapazes para desenvolver o trabalho. Cheguei aqui com 19 anos e comecei a estudar a língua portuguesa para poder me comunicar. Fiquei nesse trabalho por quatro anos, até terminar o contrato.
E como o senhor veio para o Ceará?
Eu estava solteiro e com dinheiro, queria conhecer o País. Procurei no mapa do Brasil o lugar que tinha menos japoneses, e encontrei o Ceará. Aqui conheci minha esposa e criei meus filhos. Eu vim a passeio, mas se tivesse trabalho, eu ficaria. Quando cheguei, fui apresentado ao Benedito Macêdo, da família Macêdo (fundadora e proprietária do Grupo J.Macêdo) e começamos a trabalhar.
O que o senhor fazia?
O Benedito Macêdo tinha o Sítio Uirapuru (hoje Condomínio Espiritual Uirapuru). Era a maior propriedade particular de Fortaleza, com 200 hectares. Começamos a plantar hortaliças, frutas e legumes. Na época, Fortaleza não tinha consumo de verduras. Verdura, por aqui, era só para tempero. Praticamente, quem introduziu o plantio de hortaliças, aqui, fui eu. Como eu era técnico agrícola e tinha facilidade de conseguir sementes, em São Paulo, comecei a plantar todo tipo de verdura, tomate, melão, melancia... aos sábados, as pessoas formavam filas para comprar.
Por que trabalhar com agricultura orgânica?
A agricultura convencional usa muitos defensivos, que são prejudiciais à saúde. Na agricultura orgânica, nem o adubo pode ser químico, tem que ser tudo natural. É preciso muito conhecimento para identificar o que as plantas precisam. Para se desenvolverem bem, elas necessitam de macronutrientes (nitrogênio, fósforo, potássio e cálcio) e micronutrientes (zinco, ferro, magnésio, manganês, dentre outros). Só que não pode ser químico, temos que trazê-los de rochas ou outras plantas.
E quais são os resultados?
Tenho um exemplo do morango. No ano passado, produtores plantaram morango em São Benedito, com métodos convencionais, inseticida, fungicida, tudo. No inverno, começou a chover, morreu tudo. Mas o meu morango orgânico resistiu e está verdinho, já produzindo. Outra vantagem da agricultura orgânica: dentro da planta estão todos os nutrientes que a gente precisa. Quem come orgânicos com certeza adoece menos. Eu tenho 80 anos e nunca fui a um hospital.
Qual seu conselho para quem pretende se tornar um emprendedor?
É como diz o ditado japonês: caia sete vezes, mas levante oito. Eu já quebrei muitas vezes, às vezes investindo errado, mas nunca desisti. Sou insistente. O sujeito empreendedor pode até quebrar, mas não pode acomodar. O acomodado não vai ter futuro. Tem que acreditar naquilo que você sabe fazer. Eu não dou nada para ninguém, mas sei levantar, todos os dias, e fazer o futuro ser bem-sucedido.
Começar de novo
Depois de trabalhar com agricultura por 25 anos no Brasil, Jiro Nagaura decidiu deixar tudo para trás e levou a família – a esposa e os quatro filhos, na época – para o Japão. “A inflação brasileira era muito alta naquele tempo, 700% ao mês. Não deixei nada aqui. Fiquei ‘liso’, vendi até o carro para comprar a passagem de avião”, conta Jiro. No retorno à terra natal, abriu uma loja para vender produtos brasileiros. “Eu importava comida, revistas e CDs de músicas. Chegava a vender 100 mil CDs por mês. Havia 350 mil brasileiros morando no Japão”, relata.
Com o tempo, os filhos cresceram e decidiram voltar para o Brasil. “Eles queriam viver no país onde nasceram. Estávamos sozinhos lá, minha esposa e eu. Dois velhinhos. Resolvi começar tudo de novo por aqui”, conta. Em 2010, Jiro desembarcou no Ceará e voltou a aplicar, ainda com mais determinação, as técnicas naturais no cultivo de frutas, verduras e legumes.
O capital reunido no Japão foi usado para comprar equipamentos, insumos e terras na região de São Benedito, na Serra da Ibiapaba, com clima mais favorável para a agricultura. Aliás, ele já conhecia o local desde que chegou ao Ceará, na década de 1950. “O Benedito Macêdo queria plantar batata inglesa, mas eu disse que precisávamos de um clima mais ameno. O calor não é ideal para a batata. Fomos até a Serra Grande e ele comprou um terreno lá”, descreve.
Jiro se apegou tanto à região que decidiu fixar residência em São Benedito, onde mantém propriedades que somam 310 hectares – sendo 8 hectares cultivados. Com quatro filhos e dez netos, o simpático e jovial empresário festeja o expressivo volume de produção (“mais ou menos 5 mil kg por semana”, informa) e ainda encontra tempo para atuar como consultor técnico de duas cooperativas de produtores agrícolas do interior. “Sou responsável pela alimentação de mais de 50 pessoas, que fazem parte dessas cooperativas, sem contar meus funcionários na Serra. Felizmente, não sou miserável: pago bem para os funcionários, porque se a pessoa não ganha bem, não pode desempenhar seu trabalho”, observa.

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